Como compreender a ascensão da Extrema-Direita
Numa altura em que assistimos a uma ascensão dos partidos de Extrema-Direita na Europa, e no rescaldo da primeira volta das eleições presidenciais no Brasil, na qual um candidato misógino, homofóbico e racista (entre tantas outras características que lhe podem ser apontadas) quase obteve maioria absoluta, importa refletir sobre o porquê deste crescimento. Muito tem sido debatido relativamente aos motivos sociopolíticos, analisando o desgaste da suposta Social-Democracia até então vigente, no entanto, este texto tem como premissa analisar esta questão partindo de um prisma diferente, tendo por base as características psicológicas humanas que nos podem tornar propensos a assimilar ideologias de Extrema-Direita.
Comecemos pelo princípio mais básico: o altruísmo não é inato. As ideias de partilha, igualdade e respeito pelo outro não existem logo à nascença. Todos estes conceitos, essenciais para a Civilização, são aprendidos e apreendidos no decorrer da nossa vida, não só por experiência própria, como também através da aprendizagem vicariente (observação do Outro). Nascemos com instintos egoístas, associados à nossa própria sobrevivência. Todavia, isso não significa que tenhamos inevitavelmente de ser misantropos. No decorrer da nossa experiência estabelecemos vínculos, que nos tornam empáticos e é essa empatia que nos pode fazer ambicionar um Mundo justo, onde defendemos que quem nos rodeia merece ter as mesmas oportunidades que nós.
A Extrema-Direita retira das populações os instintos mais básicos relacionados com a suposta auto preservação: o “Eu primeiro que o Outro” (“Nós versus Eles”), como se existisse uma permanente luta pela sobrevivência, onde a empatia passa para segundo plano, com a falsa assunção de que as nossas necessidades mais básicas estão sempre em risco – manipulação através do medo. Até mesmo populações mais esclarecidas podem ceder perante esta luta ilusória, onde os media assumem um importante papel, noticiando hipotéticas fontes de ameaça (os exemplos mais presentes são os refugiados), recorrendo ao sensacionalismo como forma de obter audiências.
Mais ainda, esta insegurança é agravada pelos efeitos corrosivos da desigualdade social e económica, com o fracasso das nossas instituições na identificação do sofrimento das classes trabalhadoras, em reconhecer os seus sacrifícios e recompensar o seu trabalho. A desigualdade faz com que as pessoas se sintam inseguras, preocupadas com o seu bem-estar, tornando-as mais vulneráveis ao julgamento dos outros, o que culmina num maior distanciamento social. Esta insatisfação é aproveitada pelos mecanismos dos media de Extrema-Direita, tal como ocorreu com a campanha de Trump, que a alimentam com discursos de ódio, apontando as minorias como bodes expiatórios. Mais ainda, as redes sociais têm ajudado na rápida propagação de opiniões mascaradas de notícias, tornando difícil a básica separação entre factos e mitos. Defender ideias de Igualdade, Liberdade e Democracia exige esforço, obriga-nos, muitas das vezes, a sair da nossa própria “pele” e a colocar-nos no lugar do “Outro”, e este exercício de perceção é ainda mais complexo quando existe a variável medo.
Um erro que não podemos cometer é partir do princípio de que todos os eleitores de Extrema-Direita são racistas, xenófobos, homofóbicos, misóginos ou fascistas. Tal interpretação é redutora e só nos leva a analisar o que está a acontecer no Mundo de forma enviesada, originando, consequentemente, uma resposta ineficaz. As pessoas sentem que existe muito a perder (até mesmo conquistas associadas à luta da Extrema-Esquerda) e veem na Extrema-Direita uma alternativa de rotura / resistência às possíveis ameaças externas (novamente o “Nós versus Eles”).
Como combater tudo isto? Aceitando, analisando e compreendendo a nossa Natureza Humana. Da mesma forma que a Extrema-Direita manipula uma das emoções mais básicas do Ser Humano, o medo, devemos implementar estratégias que diminuam essa resposta inata. O medo, os estereótipos e os preconceitos combatem-se com informação e exposição, demonstrando que o fracasso não reside meramente na democracia, mas sim, na forma como esta tem vindo a ser fracamente aplicada por quem tem sido eleito. Cabe-nos a tarefa de ser a alternativa ao sistema vigente, combatendo o ódio com Liberdade, e possibilitando uma alternativa democrática ao descontentamento das populações.